Luiz Silveira
Os preços mundiais dos alimentos bateram recordes neste ano, levantando preocupações com o risco de agravamento da fome. Esse processo, no entanto, está longe de acabar, e a melhor solução para ele é aumentar a oferta de alimentos. “Continuaremos passando por forte crescimento da demanda por alimentos”, avalia o economista José Roberto Mendonça de Barros, diretor executivo da consultoria MB Agro.
O índice de preços de alimentos da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) atingiu o pico de 238 pontos em fevereiro, e vem caindo levemente. Em agosto, o índice fechou a 231 pontos, ainda mais de 20% acima de 2010.
O especialista elenca abaixo os cinco fatores principais que causam a alta dos preços, e alerta que o agro do Brasil tem grandes desafios para aproveitar a sua capacidade de ampliar a oferta de comida. Mas faz uma ressalva: “Tivemos 35 anos de quedas reais no preço dos alimentos no mercado interno. O que redistribuiu renda de verdade no Brasil foi a comida barata”.
A queda no preço dos alimentos alivia mais o bolso dos mais pobres, por isso Mendonça de Barros fala em redistribuição de renda. As famílias pobres gastam uma parte maior da renda com a alimentação do que as famílias ricas. Assim, quando a comida fica mais barata para todos, sobra mais dinheiro – proporcionalmente – para as famílias de baixa renda.
Mas isso é no mercado interno. Os preços internacionais dos alimentos tiveram alta durante quase toda a última década. O movimento só foi interrompido temporariamente pela crise financeira de 2008. Para Mendonça de Barros, os fatores que explicam essa tendência são:
1º: Crescimento e urbanização da população
A ONU estima que a população mundial em 2050 será quase um terço maior do que a atual. Isso significa 2,3 bilhões de pessoas a mais demandando alimentos. Além disso, há um forte processo de urbanização nos países emergentes, que resulta em uma demanda ainda maior por comida. Isso acontece porque os hábitos alimentares mudam nas cidades.
2º: Novos consumidores
Entre 2003 e 2009, 20,4 milhões de brasileiros saíram da pobreza, segundo dados da FGV. Mas o aumento da renda e o crescimento da classe média não são fenômenos só brasileiros. Em muitos países em desenvolvimento, pessoas pobres estão tendo mais empregos e renda melhor, o que eleva o padrão de consumo. Essa elevação costuma começar justamente na compra de mais e melhores alimentos.
3º: Biocombustíveis
Os Estados Unidos são os maiores produtores mundiais de milho, e estão usando um terço de sua produção anual para fabricar etanol. Ao contrário do etanol brasileiro, que é feito a partir da cana-de-açúcar, o álcool e o biodiesel dos Estados Unidos e da Europa são feitos com matérias-primas utilizadas como alimentos. A demanda adicional da indústria de biocombustíveis eleva as cotações dessas matérias-primas. Já o etanol brasileiro tem grandes oportunidades por não pressionar o preço dos alimentos.
4º: Desvalorização do dólar
A moeda americana vem perdendo valor contra todas as moedas do mundo, o que faz subir o preço das commodities (soja, milho, café, minério de ferro, petróleo etc.). Isso acontece porque a maior parte desses produtos tem suas cotações em bolsa negociadas em dólares. A maneira mais fácil de entender é com um exemplo: se US$ 1 valesse R$ 2, e um quilo de soja valesse US$ 10, seriam precisos R$ 20 para comprar esse volume. Mas se o dólar caísse para R$ 1,50, o brasileiro necessitaria de apenas R$ 15 para comprar o quilo de soja e teria poder de comprar um volume maior. Por isso, os preços sobem quando o dólar cai.
5º: Fundos de commodities
Para se proteger contra a desvalorização do dólar, os investidores compram contratos de commodities nas bolsas. Afinal, os preços tendem a subir e assim valorizar o dinheiro aplicado. Mas o crescimento dos fundos de investimento em commodities impacta os próprios preços desses produtos. Quando uma commodity tende a subir, os fundos compram e fazem o preço subir ainda mais. Da mesma forma, se a tendência muda e os preços tendem a cair, os fundos vendem seus contratos e ampliam a baixa.
Desafios
Essa conjunção de fatores cria oportunidades de negócios para países que são grandes produtores de alimentos, como o Brasil. “Com exceção do trigo, o Brasil produz em larga escala todos os produtos mundiais mais importantes”, pontua Mendonça de Barros.
Mas traz também desafios. “Por causa desses cinco fatores, temos o triplo desafio de aumentar a produção de forma acelerada, alterar a composição da produção e atender uma legítima exigência ambiental”, explica o economista.
Um obstáculo que se coloca para o Brasil é o que Mendonça de Barros chama de “doença dos custos altos”. Por trás deste problema está um conjunto de fatores: a elevação da carga tributária; a piora da qualidade da regulamentação dos negócios; a energia elétrica que é uma das mais caras do mundo; a péssima infraestrutura; e a escassez de mão de obra. “Essa doença já está matando a indústria brasileira e agora está chegando ao agro”, diz ele.
Outro desafio é enfrentar o real valorizado. “Como os problemas de custo e câmbio são sistêmicos e não se alterarão no curto prazo, o que cabe fazer é manter a inovação e ganhar eficiência”, opina ele. Há ainda um terceiro desafio, que é resolver todos os problemas anteriores sem deixar de preservar o meio ambiente. “Não sou pessimista, porque os desafios dos últimos quarenta anos eram tão grandes ou maiores do que esses, e foram vencidos”, afirma o economista.
FONTE: Rede Agro
ADAPTAÇÃO: Brasil Agrícola