*Mozart
Neves Ramos
*Mozart Neves Ramos é membro do Conselho de Governança do Todos Pela
Educação e do Conselho Nacional de Educação, e professor da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE). Artigo publicado no Correio Braziliense do dia
03/05/2012.
O último Censo
da Educação Superior revelou que, de 2009 para 2010, o número de matrículas nos
cursos de graduação no ensino superior brasileiro cresceu 7,1%, contabilizando
crescimento de 110,1% na última década. Esse crescimento se deu
majoritariamente no setor particular do ensino superior. Hoje, 74% das
matrículas nesse nível de ensino são de responsabilidade do setor privado, ou
seja, 4.736.001 do total de 6.379.299.
Nesse
contexto, há de se destacar o crescimento na modalidade de ensino a distância,
como resultado da necessidade de alinhar trabalho e flexibilidade de horário
para estudar. Hoje essa modalidade já é responsável por 15% de todas as
matrículas nos cursos de graduação. Outro interessante aspecto, extraído desse
censo, foi a diversificação da oferta, mediante a expansão das matrículas nos
cursos tecnológicos. Em 2001, esses cursos respondiam por 69.797 das matrículas
no ensino superior; em 2010, o número pulou para 781.609, ou seja, um
crescimento superior a mais de 10 vezes em uma década.
Apesar
do crescimento significativo, o País ainda apresenta percentual relativamente
baixo de jovens, na faixa etária de 18 a 24 anos, cursando o ensino superior:
apenas 14,6%. Para se ter uma ideia, em alguns países da comunidade europeia
esse percentual chega a ser de mais de 50%. Por essa razão, uma das metas do
novo Plano Nacional de Educação (PNE), que ainda tramita no Congresso Nacional,
prevê uma expansão dos atuais 14,6% para 33% até 2021.
É
importante registrar que, com base no PNE 2001-2010, esse último percentual era
o que seria esperado já para 2010. Em números absolutos, significa termos, em
2021, 13 milhões de estudantes matriculados em cursos de graduação. Para isso,
o País, em termos de investimento no ensino superior, sairá dos atuais R$ 24,8
bilhões para R$ 49,6 bilhões. Isso significa dobrar os atuais investimentos
dessa etapa da educação ao longo dos próximos 10 anos.
Esses
investimentos devem não apenas dar conta da recente expansão do ensino superior
público, em decorrência da interiorização das universidades federais nos
estados e da diversificação com a criação da rede de Institutos Federais
Tecnológicos (Ifets), mas também da necessária expansão dos vitoriosos Programa
Universidade para Todos (Prouni) e Fundo de Financiamento Estudantil (Fies),
aplicados ao ensino superior privado.
Esses
programas têm permitido que jovens de baixa renda possam realizar seus cursos
de graduação e, assim, terem diploma de nível superior. Apesar de sua
importância para a democratização do acesso ao ensino superior, eles ainda são
tímidos quando comparados com a atual demanda. Por exemplo, o Fies este ano foi
responsável por 254 mil novas matrículas, mas isso corresponde, por seu lado, a
somente 5% do total de matrículas do ensino superior privado.
Porém,
o maior desafio para a tão necessária expansão do ensino superior não está no
financiamento, mas no enfrentamento da qualidade da educação básica. Mesmo nos
atuais 14,6% de jovens de 18 a
24 anos no ensino superior, há boa parcela que ingressa no terceiro grau com
formação muito aquém da desejável. Isso se traduz principalmente nos cursos que
exigem certo nível de aprendizado anterior em disciplinas como matemática, por
exemplo.
As
reprovações, e consequentes abandonos, nos ciclos básicos das engenharias e das
ciências exatas são elevadíssimos. Os dois primeiros anos têm sido fatais para
grande parcela de jovens que ingressam nesses cursos, e logo no momento em que
o Brasil mais precisa de profissionais como engenheiros, químicos, físicos e
matemáticos. Hoje, o País forma pouco mais de 30 mil engenheiros por ano,
quando se estima que a demanda seja de mais de 60 mil. A Coreia do Sul forma 80
mil; a Índia, 300 mil e a China, mais de 400 mil ao ano.
Para
melhor compreender a falta desses profissionais no Brasil, para responder ao
atual crescimento econômico, é preciso olhar o percentual de alunos com
aprendizagem esperada em matemática no fim do ensino médio. Dos que terminam,
sendo que metade dos jovens ficou pelo meio do caminho, 89% não aprenderam o
que seria esperado nessa disciplina, especialmente alunos da rede pública de
ensino. Isso tem efeito direto na aprendizagem de outras matérias, como física
e química.
O
desafio da expansão do ensino superior, especialmente na área de exatas, passa,
portanto, necessariamente pela oferta de uma escola de boa qualidade para a
juventude. Sem resolver os problemas de aprendizagem já na educação básica,
dificilmente teremos uma formação no ensino superior de qualidade.
FONTE: Jornal da Ciência, Edição 4489